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terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Alteração de endereço.

Me mudei. Não sei por quanto tempo, não sei se é temporada ou se por lá viverei estações. O certo é que não estou aqui.

Ontem mesmo me procurei. Na sala, no computador e até debaixo da cama. Mas não estava. A mochila estava no armário, sinal de que não tinha levado bagagem, mas no ar pairava um bom perfume, cheiro fresco pós-banho de quem sai de mudança. É, eu fui.

Tô num lugar de não muito fácil acesso, mas também não espero visitas, não. Mas é bem bonito. Fica entre um sorriso doce e um olhar que pede. Há pouco espaço, nem sempre confortável, mas se a decisão for de ficar, abro uma parede aqui, derrubo uma distância ali, um pouco de desejo embutido, pra caber mais... Por enquanto mal me cabe, às vezes nem cabe e a porta não abre. Mas especulo, invisto, o mercado ensinou assim.

O preço? É alto. Às vezes penso que não vou poder pagar e não me resta quase nada.

À noite é um tanto frio, mas eu tenho papel e caneta aqui. E eu projeto os sonhos, desenho lua e sol e vou pregando na parede de onde tirei o velho calendário, criando a agradável confusão de não saber o que é dia nem noite, sem a noção do tempo que poderia me preocupar.
Mantenho uma única vela acesa o tempo inteiro a clarear o caminho. Uma hora eu posso precisar voltar...
Imagem capturada do bloguinhobasico.blogspot.com

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009


Deixa que a chuva lave
Deixa que o vento seque
Deixa que o tempo passe...
Se de nós independe,
Solta, pois, as rédeas
Deita sobre meu peito e sonha...
Deixa!
Amanhã eu te devolvo os ponteiros...




Imagem googleada.

sábado, 21 de fevereiro de 2009


Da vaziedade

Da cidade

E do meu coração,

Não tem samba-enredo,

Não tem aconchego,

Não tem você cedo,
Avenida de ilusão.

Aqui e lá
Só se ouve nota em dó

Meu sol é só

Fantasia em vão:

Isso não dá samba, não.


Imagem capturada do blog: www.letgo.blogger.com.br

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Pausa para ele:


Daqui desse momento
Do meu olhar pra fora
O mundo é só miragem
A sombra do futuro
A sobra do passado
Assombram a paisagem
Quem vai virar o jogo e transformar a perda
Em nossa recompensa
Quando eu olhar pro lado
Eu quero estar cercado só de quem me interessa
Às vezes é um instante
A tarde faz silêncio
O vento sopra a meu favor
Às vezes eu pressinto e é como uma saudade
De um tempo que ainda não passou
Me traz o teu sossego
Atrasa o meu relógio
Acalma a minha pressa
Me dá sua palavra
Sussurre em meu ouvido
Só o que me interessa
A lógica do vento
O caos do pensamento
A paz na solidão
A órbita do tempo
A pausa do retrato
A voz da intuição
A curva do universo
A fórmula do acaso
O alcance da promessa
O salto do desejo
O agora e o infinito
Só o que me interessa

(É o que me interessa - Lenine)

Imagem - arquivo pessoal/ Show Labiata, Fortaleza, 15 de fevereiro de 2009.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

E quase aos 33, um passado próximo...

Toda essa viagem no seu próprio tempo aconteceu aos trinta. Eram trinta anos, dos quais os últimos dez lhe trouxeram um tal peso que a fizera curvar as costas. E a linha do seu olhar também já não mirava o horizonte. O olhar fixo no chão parecia buscar as marcas das pisadas mais seguras, que garantissem menores riscos. Era um andar lento e um tanto desatento, visto que buscava sempre o que havia ficado para trás, revendo paisagens antigas, respirando cheiros já dissolvidos e que a fazia perder muitas coisas, inclusive tempo.

Naquela manhã acordara com quinze anos. Diante do espelho, nenhuma das marcas que exigiam cuidado lhe traziam preocupação. Sorriso nos olhos. Luz nos olhos. Borboletas batendo asas no estômago, provocando aquele aperto adolescente que se refletia em sinais bastante adultos por todos os cantos do corpo. Inquietude completa. Um desejo quase infantil de viver todos os dias naquele.

Assim passou o dia inteiro, debutando naquela novidade já tão familiar. E mastigou cuidadosamente cada uma das horas na intenção de retomar o comando, o compasso da respiração, o senso e tudo mais aquilo que se costuma perder nessa fase. Ainda que cheia de juventude, ficou para ela provado o quanto isso tudo também cansa e mantém longe do cais da tranqüilidade. E mais uma noite fez a roda do tempo girar. E acordara com a cabeça a salvo sobre o travesseiro, fiel e silencioso conhecedor de todo esse vai-e-vem. Tinha quarenta, enfim. E para sua surpresa, todas as marcas reveladas pelo espelho sugeriam uma beleza desconhecida e infinitamente superior àquela dos quinze. Viu que mais que "marcas de expressão", era necessário reconhecer "expressão de quê". E era do melhor.

No corpo uma leveza indefinível. Nem o curvo cansaço daqueles antigos trinta, nem a volatilidade perigosa dos quinze. Voaria, se quisesse, mas poderia prender-se ao chão, se necessário.

A música povoou a casa. Cantou e dançou sem pudores, feito criança. Mas com a consciência daquilo que fazia, feito mulher. Estava tudo claro e arejado. O dia parecia muito mais bonito, simplesmente porque decidiu olhá-lo como o é. Estava inteira e definitiva em si.

Experimentou o sabor de dizer não, de recusar aquilo que não materializava seus desejos, sem sentir culpas pela negativa e nem a mutilação de se obrigar ao que não queria. Disse sim a algo simples, mas que de certo era algo que queria, o que causaria sorrisos largos por quaisquer motivos, pelo simples fato do poder da escolha, independente dos horários, das conduções, itinerários e satisfações.

Usou seu perfume mais fresco e saiu pela rua. Caminhos tantas vezes trilhados, demorados, tinham outra cor e o tempo gasto, se demorava, não importava. Não havia pressa. Não há pressa.

Dali em diante, acordar, independente de com qual idade, significava obrigação de viver. Cada minuto, cada instante. Sem a necessidade de visitar o passado nem de se preocupar com os séculos que estavam por vir.
(Coisas de 2005...)


Imagem capturada do blog www.copacabanadetoledo.blogger.com.br

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Coisas atuais, de tempos atrás...

Acordou devagar. Ao segundo ou terceiro toque do despertador algoz de todos os dias, que hoje consciente, perdera boa parte do seu poder. Abriu somente os olhos. Não havia movimento em nenhum outro músculo seu. Até o coração parecia meio débil. Podia estar assim. E era vontade sua. Levantara num espreguiçar esplendoroso e até então nenhum pensamento viera à cabeça.

Fez o trajeto de costume, mas hoje sem tanta obrigação, o que permitiu um contemplar diferente das ruas, do vai-vem dos veículos e pôde até perceber a música que tocava ao rádio. Cumpriu suas atividades e retornou à casa, com o pensamento repousando sobre os imensos cúmulos que davam um tom algodoado ao imenso céu azul. Imaginava que precisava dar algumas explicações, metaforizadas, mas explicações. O porquê da ausência, o porquê de uma tristeza aparente...

- É preciso que saibam que estou bem. Que se falo de tristeza, é de uma tristeza ressecada, sem qualquer umidade. Que os olhos que vigiam os escritos não possuem em si qualquer vestígio de lágrima. Que essa tristeza retratada em palavras é emoldurada por uma imensa alegria de ter os pés no chão, de conhecer a si de entender os limites, e de entender também as faltas, mas não há motivo para lamento ou qualquer tipo de punição. Que não há motivo para consolo.

Passou a tarde numa preguiça morna. Havia coisas a serem feitas, mas tudo pode esperar. Fez visitas sem culpa ao espelho e cuidou para que o que visse ficasse ainda mais prazeroso. Seus cabelos estão mais curtos e mais negros que nunca. Conseguia ver, de dentro, o sorriso que reluzia em branco contraste.

Não aguardou por nenhum telefonema e eles todos vieram, aos quais deu as respostas que achou corretas. Não marcou nada. Fez-se de desentendida dos convites feitos nas entrelinhas. Recusou-os nas entrelinhas.

Pôs-se a escrever as tais explicações. É chegado o momento do retorno. Está aberta a temporada festiva. Colocou Chico Buarque para tocar, alimentando-lhe a inspiração. Lembrou-se do vinho. Serviu-se de uma taça, hoje vazia de significados, cheia apenas da cor rubra, do cheiro entorpecente e das vontades que ali nascem.

Com a chegada do céu escuro, decide abandonar os escritos e a taça, agora já vazia. Não tinha a menor certeza se conseguira dar as tais explicações. Mas o que era preciso ser sabido já existia. Ela transpirava significados, estavam todos à flor da pele, sem a menor necessidade dos vidros nos olhos para enxergá-los...
Imagem capturada do blog: blogdapalavra.blogs.sapo.pt

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Contraplano


Era pra ser fina garoa
Mas virou um temporal.
Quis escrever um hai-cai
E me deparei com um soneto.
Decidi ficar perto da saída de emergência
E percebi que sequer há extintor.
Desejei cantarolar
E sorvi Chico.
Saí pra ir à esquina
E a estrada longa já ficou pra trás.
Procurei uma flor
E me percebi estampada.
Ensaiei uns passos de samba
E vi que estava em pleno carnaval.

Imagem googleada

domingo, 1 de fevereiro de 2009

(...) Entre nós
Poucos quilômetros de uma linha reta
E anos-luz de uma vontade torta.