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quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Revista Cultural Novitas Nº 7

Mais uma vez tenho a honra de estar na revista eletrônica da Editora Novitas.
Agora você pode acessar o site da editora para fazer o download ou usar o leitor eletrônico abaixo.
Obrigada mais uma vez, Letícia Losekann e David Nóbrega, pela oportunidade.

domingo, 19 de setembro de 2010

O beijo e seu endereço *


                                                                                   Foto: " O beijo" de Rubens Gerchman 


Li, em algum lugar do passado, um texto que falava sobre o tal “beijo no coração” e a cadeia de possibilidades, de sentimentos românticos que poderiam ser desencadeados pelo recebimento do próprio. Um beijo no coração recebido e estava posto o enigma: perceber a entonação, identificar o olhar, ler o movimento labial, tudo para encontrar o real paradeiro que o tal beijo queria tomar. Não lembro bem do desenrolar do texto, mas lembro que tinha acordo em achar um carinho meio esquisito para determinadas pretensões.

Já ganhei vários desses. Embrulhados com laço de fita e brilho no olhar como brinde. Confesso que não gostei, quis devolvê-lo prontamente e falei isso ao doador do beijo. Não, não foi rejeição minha, tampouco mau-agradecimento. É provável que eu não estivesse carente de beijo no coração, pelo menos naquele momento.

É uma pena, mas não dá pra sentir qualquer resposta do corpo a um beijo no coração. Vai ver que meu desejo tinha um endereço mais visível e mais fisicamente viável e sensível. Sem falar na perda criminosa de uma oportunidade de tocar o corpo, sentir o gosto, compartilhar da respiração, tudo sem deixar qualquer vestígio.

Eu não consigo mandar beijo no coração de ninguém. No da minha mãe, talvez. Sinto o beijo no coração como um ato que possui um carinho muito específico. Aquele carinho que ergue um muro largo, alto e resistente entre a boca que beija e o órgão que recebe. Nesse caso, o beijo me parece ficar na altura do peito, e do peito mesmo, não do seio. Quem dera! Será que é porque dizem que coração dos outros é terra que ninguém anda? Obviamente, se não se anda, muito menos se beija.

Estou certa de que no momento em que me dedicam “um beijo no coração”, essas palavras vieram acolchoadas de um carinho gigantesco. Mas no fundo, ou nem tão fundo assim, ainda que meio inconsciente, a intenção é outra. É como mandar um “beijo no juízo” Já ouviu esse? Eu já. Pra mim não passa de um recado, do tipo “cuide-se, tome juízo!”

O beijo no coração também tem entrelinhas, carrega seu recado implícito, ainda que pra mim, que o conheço bem, escancarado. Mandar esse tipo de beijo é pra reconfortar. Algo do tipo: um beijo no coração pra você que tem o seu tão inquieto, agoniado. Esse beijo no coração traz no bolso um elixir de paz, alento. E conforme-se só com ele, viu, baby? E assim, delicadamente, com um beijo resolve-se um mistério, esfria-se a caldeira do desejo, apaga-se o neon da expectativa. Beijo no coração é praticamente um ansiolítico!

Só se for pra você. Beijo no coração me deixa nervosa, não me aquieta a alma, não descompassa meu ritmo cardíaco, não causa nenhum suspiro, muito menos tira do casulo as borboletas que tanto querem bater asas no estômago...

Nunca vi carinho tão fisiologicamente comentado. Mas é isso mesmo. Quer me tocar o coração? Beije-me a boca, o olho, a orelha, as costas, a barriga, o pé. Descubra meu ombro para beijar. A distância, eu garanto, é muito menor, e o resultado, garantidamente eficaz.


* reedição de um texto já publicado aqui. é que esse beijo continua me incomodando. rs.

domingo, 12 de setembro de 2010

Oração da Rua*


Que esta rua seja minha
Sua, dela, de quem queira
Fins de tarde, noite inteira
E a liberdade como vizinha.

Que seja nosso o banco da praça
De direito, não de graça
E que venha o dia
Que se faça na rua alegria
Seja a dele, ou a do 'maluco-beleza'
Pois são tantos tons a compor Fortaleza.

É a minha cidade-aquarela
E bela - por querer sujeito
Quem só conheceu esmola e preconceito.

Do "Passeio Público": ver o mar.
No "Coração de Jesus": repousar.
Cantando notas de improviso
Sonhando um futuro impreciso
Mas que o batuque, o sorriso não nega:
Que jamais seja a cidade cega
A não reconhecer passarinho
Aquele a quem só falta o ninho.

*Poema classificado em 1°lugar no Concurso de Poesia Crítica  da Faculdade Cearense em agosto de 2010

Imagem capturada do blog: www.somosandando.worpress.com