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quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Do nado ao nada.



Noite imensa, com ares de interminável. Chovia lá dentro. Mas só lá dentro. Do lado de fora, apenas a ventania da tal primavera que não colore essas cercanias e cujas flores enfeitam somente a poesia que gravita. Vento, muito vento a remexer as ideias, a testar, feito quebra-cabeças, a peça correta no lugar ideal e formar alguma imagem, alguma paisagem, quem sabe de um campo de flores. Mas o vento voltava e a tudo desorganizava, como quem desdenha do desejo lírico de encontrar a verdade, os porquês, as saídas.

Junto com o sol, apenas uma resposta veio clarear: o motivo dos seus braços tão cansados. De olhos fechados pôde ver que nadara demais. Foram dias, horas, estações, folhas de calendários vividas em mar aberto, com braçadas que apontavam para qualquer lugar que não fosse o que estava. Era preciso tomar distância em grandes goles, embebedando o corpo com a ilusão de que havia calmaria no cais. De que haveria calmaria. De que haveria cais. De que haveria.

Houve erro de direção, houve tormenta e houve descoberta. Sem bússola, sem astrolábio, sem Sagres e sem intenção. Sem cais e sem calmaria também. Nadara praticamente uma vida e sem qualquer esforço, seus pés tocavam o chão. Não, o tempo, a distância, as braçadas não levaram à profundidade. Tantas noites de céu com menos estrelas que o comum e a permanência no raso, no superficial, no epidérmico. A pele ressecada, o gosto de sal compartilhado entre o mar e os olhos e a praia como única certeza, a terra: o lugar menos firme que já pôde conhecer.

Não se sabe onde o rumo foi perdido. Ou talvez a consciência tenha partido de uma rajada de vento, de uma onda mais violenta. A disposição de chegar à profundidade incluía a possibilidade de afogamento e isso era sabido. O que não sabia, é que ainda estava completamente submersa e talvez não sobrevivesse a mais uma imersão sem garantia, num espaço de tempo incontável, que não cabe em si nem no mar.

Há fortes possibilidades de não ter sido em vão.

Foto: arquivo pessoal

6 comentários:

Alisson da Hora disse...

tão lindas...

quando não é em vão, cada braçada vale a pena...

Liuengel disse...

me sinto assim.

Marina Karolina. disse...

belíssimo texto!
Faz pensar...

Rafaela Figueiredo disse...

ai, Moni...
ser profundo tem dessas coisas, né?
verdade q, no fundo [!], não é ruim, não.
um paradoxo interessante: a força na mais pura sensibilidade.

beijo, lindeza

Rafaela Figueiredo disse...

[gente, que mundo pequeno mesmo! vi ali que vc curte a Ju Farina, e eu tenho uma amiga que é amiga dela. quantos laços... :) ]

Unknown disse...

Parabéns. E obrigado por me enriquecer com um texto tão bonito.