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domingo, 18 de setembro de 2011

Calendários



Bem antes do último dia, suspirava pelos outros, inevitavelmente melhores. Era uma verdade matemática, expressa nos ímpares pelos quais tem mais afeto.

A noite explodiu em cores no céu, abrindo um sorriso em cada tom e cada um dos efeitos era repetido na vidraça clara do olhar. Bastava esperar o dia clarear, sentir os pés descalços na areia, abrir os braços, os olhos e buscar o presente, já desembrulhado e efervescente de vontade de ser.

O que não estava escrito, o que jamais fora previsto é que a velocidade concorreria com a possibilidade, com a vontade e com tantas outras rimas. De repente não foi dando tempo, assim mesmo, no gerúndio, e tudo o que ia acontecendo não ia tendo como continuar. Assim mesmo, no gerúndio.

Foi tudo passando, foi tudo ficando pra trás. Aquele novembro, ainda dá pra ver. Ficou um pouco distante e quando esse novembro chegar, ele irá será magicamente desfeito, oficialmente dissolvido, carregado de descrença para o resto do mundo e ficará guardado na tal caixa-memória, com laço de fita vermelha e uma borrifada de perfume. O pretérito só é perfeito quando guarda um cheiro bom.

Obediente ao poeta, o agosto não foi de esperar setembro, mas ele chegou. Sem festejo, mas trouxe o vento e a presença tênue de pólen no ar. Melhor assim: são flores sem endereço, de cores desconhecidas, vivas, alvoroçadas pelo vento em algum lugar, sem nenhum buquê que as prenda, sem nenhum cartão a elas amarrado, e que carrega, nas entrelinhas um prazo de validade.

Com o vento, o pólen, as flores e a poeira sobre os móveis. É como se o tempo avisasse que é hora da limpeza, da arrumação. Que misticamente ou não, por crença ou superstição, é preciso rever, reordenar, limpar, lavar. Jogar fora o que não serve mais, quem sabe de cinco anos pra cá. O melhor, depois de limpo, pode ficar. Mantém-se na estante. Ou junto com aquele novembro, talvez, para roubar sem alarde um pouco o cheiro bom que ele irá emanar.

Hora da matemática outra vez. É quase sempre possível calcular algo ímpar, cruzar os dois dedos e torná-los um. O mesmo um que pode, em riste, apontar pro alto confessando a posse: este é meu!

Imagem retirada daqui.