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domingo, 25 de maio de 2008

O melhor de tudo
É que há o hoje para reparar os estragos de ontem
É feito sopro de mãe no machucado
Feito abraço saudoso, apertado.
E tem ainda amanhã
Com cheiro de fruta doce, maçã,
E desse não escapa ninguém.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Olhei atentamente para os meus sinais da boca, sedenta de um beijo que um dia seria roubado, adoçado com mel, e que mais tarde viraria até canção. Lamentei as coisas que essa mesma boca um dia se negou a dizer e que hoje insiste em falar sem ser ouvida.

Foi uma longa viagem, um tempo dentro de mim mesma que embora não tendo procurado outras paisagens, outros caminhos, foi capaz de redescobrir as próprias experiências, alguns valores reais e o mais importante, projetar para os verdadeiros desejos.

Descobri. Senti. O corpo, a cabeça, o coração, falaram juntos, uníssonos e imperativos: Vá à luta. E fui. Sem armadura, sem escudo, mas com o corpo e a alma cobertos de vontade, abstrata, invisível, mas demonstrada, proferida a cada possibilidade.

Mudei trajetos, fiz e refiz planos, encurtei distâncias. Cerquei, criei uma redoma de cuidado, fiz um altar. Enfeitei com flores e canções. Intuí desejos, procurei mágicas capazes de arrancar sorrisos e me dei, sem embrulho nem laço de fita. Me dei nua, crua e inteira, irrestrita.

Mas a festa foi perdendo o sentido à medida que eu percebia que só eu gostava da música, que só a mim ela fazia dançar. Aos poucos, até as luzes apagaram. Fui colecionando flores murchas, declarações não recíprocas, silêncios, nãos, chamadas não atendidas, ausências e verdades que não precisam ser ditas.

Me dei conta de que eu estava só. Que quando pensei que havia acordado, era quando, de fato, eu tinha começado a sonhar. E já disseram que sonho que se sonha só, não passa disso. Entendi os porquês. Eu não podia esperar respostas de um outro lado que não existia. Eu não podia visualizar um futuro leve, quando o peso de um passado fala mais alto, sufoca, turva a visão de tal forma que a nada adiante se pode dar crédito.

Escolha minha. Desde sempre. Forte cobradora e dura pagadora. Mas que paga coisas caras.

Vou vivendo com o troco.

sábado, 17 de maio de 2008

Perigosos.
Passíveis de desconfiança.
Questionáveis.
Assim são as criaturas que se despem dos orgulhos,
Que jogam fora todas as armas

Submetem-se aos testes,
Expõem o corpo para o deleite,
A alma para análise,
Os olhos para julgamento,
O coração para apreciação.
Dedicam-se e procuram quaisquer brechas,
Engolindo a seco cada lágrima,
Esforçando-se contra o tremor
Fazendo da paciência a algoz companheira.
Perigosos demais.
São estes os que com intencionalidade
Querem se fazer eternos.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

domingo, 4 de maio de 2008

Das Saudades

Rua 53, número 16. Fui até lá buscar curar uma das saudades que eu sentia hoje. Nada mais contraditório ao que penso, ao que sinto, ao que prego. Não havia mais ninguém lá. Será que eu fui a única a sentir saudades hoje ou simplesmente todas as pessoas passaram a crer naquilo que eu também creio, curando suas faltas, suas dores, de outras infinitas, e talvez até bem mais eficazes formas?

Mas eu precisava ir até lá, mesmo sabendo que não haveria o encontro, o abraço, o beijo, o sorriso, depois de percorrer o longo corredor molhado e cheio de lodo, com árvores tão antigas quanto algumas saudades esquecidas por lá. Cheguei ao endereço sabendo que não adiantaria chamar, bater, porque não haveria ninguém para receber. Era claro pra mim, desde o início que seria uma atitude meramente contemplativa, mas que me remetia à necessidade de alguma energia, algum detalhe, qualquer coisa que me aproximasse... Como se eu não vivesse tão próxima, a cada dia, a cada acordar, a cada adormecer...

Pouco tempo para tantos conflitos. Ali, confrontos entre fé, solidão, dúvidas, medo, lembranças, vida, tempo. Tudo apertado e ferozmente amarrado pelo nó da saudade.

Simulei flores, projetei felicidade, ainda que eu não tivesse qualquer resquício de força pra disfarçar a tristeza nem pra segurar as lágrimas.

Eu queria ali alguma resposta que eu jamais encontrarei ou então que de tanto saber, me recuso a admitir. Quando é o final? Por que acaba para alguns, se em mim, eles jamais se acabarão?

O céu estava cinza, no mesmo tom da última vez. Chovia um pouco. As mesmas lágrimas de chuva que eu percebo cair sempre que alguém se vai... Da última vez havia tanta gente... Hoje mais ninguém. Mas a minha necessidade preenchia aquele todo, tão cheio e imensamente vazio, porque as essências, eu deveria saber, não estão lá.

Há muito não me via tão tomada por saudades. Tantas saudades. E em meio a tantos gatos, as únicas criaturas vivas que povoavam aquele lugar, tive a certeza de que algumas delas são irremediáveis.

Angustia a dúvida sobre o que fazer com as saudades vivas, de distância irrisória e que mesmo assim, não consigo um lugar, mesmo que tão frio, onde eu possa chegar, bater e encontrar.

Percebi que é em vão querer me desfazer das minhas saudades. Algumas, buscar, enquanto houver forças, a forma de encontrar, mesmo que às vezes as portas não se abram. As outras, aquelas que é inútil a busca pelo encontro de fato, definitivamente não vou tirá-las de mim, por mais que doam. Pode ser que um dia a dor se transforme em lembrança, mais simples e mais leve, de forma que eu não precise de qualquer endereço para tê-las presentes em mim.