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sexta-feira, 27 de maio de 2011

Clima(x)*



É que o lugar mais certo
O tal ponto de equilíbrio
Eu encontrei
Na extremidade da gangorra
Na possibilidade de aqui e lá estar:
Segura, pés firmes no chão
Altura, desejo de impulsão.
Como se uma força delicada
Me autorizasse o erro
Sem promessas de punição:
- Abra a porta!
Deixa a tua ousadia entrar.
Se não era bem isso,
Foi o que eu quis escutar.
Não sou de temperatura
Que o morno suporta.
Me traio em verões
Pra depois arder no inverno.
É por pura opção:
Me quero assim, desatenta
Me atirando aos riscos
Feitos a lápis,
Me emoldurando em noites
Feitas à mão.


Imagem retirada daqui.

domingo, 15 de maio de 2011

Dos impasses - ou aquilo que se fala e não se faz.


Andei acreditando da possibilidade de me surpreender. Fiquei esperando, me olhei no espelho, fui dormir com a esperança de acordar outra, de olhar pra mim e ver, finalmente, só a mim mesma. Repeti isso por cento e oitenta e quatro vezes. Em vão. E até quando eu vi mais que dois – o que podia, enfim, ser festa – as outras imagens perdiam o foco. Outras vezes se desfizeram mesmo sem que houvesse o meu desejo.

Já provaram que tudo é transitório, tudo tem um ‘até quando’. De outro lado também provam que há exceção para toda regra, o que faz com que para mim, o amanhã não seja de um todo incógnita. Tudo pode ser novo, tudo pode ser diferente, mas há algo que, intransigentemente se fez imutável, é a certeza prática, assim como eu sei que, estando viva, irei respirar.

O que não está mais aqui é o que se faz mais vivo. Até parece que vida, vida mesmo, é aquela que já se foi, que ficou pra trás. Seria algo como construir hoje o que só será vida mais adiante, agravado pelo fato de que a vida vivida hoje é a constante memória dos “tantos ontens” acontecidos. Isso desorganiza minha linha do tempo. Minha cronologia passa a ser impossível de se desenhar de tantas setas de retrocesso que eu insisto em entortá-las a ponto de apontá-las para o futuro. Quem, em sã consciência, ousará contar a minha história?

Falar de eternidade não me sacia. O “pra sempre” sempre adiado, sempre à espera é cansativo, desgastante e não evita as rugas. Pode até estar longe, mas a distância é suplantável. Mas é preciso um horizonte como parâmetro. É amanhã? Daqui a alguns dias? Ano que vem? Futuro entregue ao Deus-dará requer forças de uma juventude que eu não tenho desde que era quase criança. Nunca me importei em estar numa fila de espera onde eu sei que chegará a minha vez. Sempre chegava.

A pergunta não é mais o que virá depois do sono, porque quase nunca durmo. Pode ser antes ou durante. Com ou sem luz. Vários medos se foram com a invernada. Inclusive a escuridão que toma conta do dia.

Mas é quase tudo falácia. Rendo-me à insanidade, à insistência, ao bater-de-pé do meu pensamento. Nem questiono o quão satânico ou angelical isso pode ser. Nunca descobri onde estão as rédeas que o prendem e se elas verdadeiramente existem, agora as ignoro. Minha vontade ganha melodia de mantra e cria uma esfera impenetrável ao meu redor, garantindo o sonho independente do sono.

Não vigio mais minhas palavras. Não as escondo de mim, nem de quem as precisa ouvir. E eu as ouço mais uma vez. Faço-as ouvir mais uma vez. E elas vão ganhando status: de som, de texto, de fotografia, de pedra. É o meu relicário do que não passou porque eu sei que o é. Naquele vai-e-vem do tempo, só uma coisa é certa: o presente. Esse estado indecente do ser-não-sendo. E que eu insisto apostando, querendo ganhar.

Entendo as boas-vontades que emanam de todos os lados. Mas não gosto que me peçam sanidade, mudança de atitude, força, equilíbrio ou determinação. Não quero que me cobrem uma hora exata para que tudo se transforme, para que tudo mude de direção. Não que eu não possa, mas porque quero provar o contrário. Que aquilo que todos chamam de profundidade ainda é, pra mim, epidérmico. E assim eu rasgo todos os tratados, as teorias da duração e as receitas de auto-ajuda. Ninguém me ouviu pedindo ajuda. Até os conselhos, vá lá, por boa educação, por considerar uma palavra aqui outra ali, as quais eu remendo, sem culpa, na ordem que melhor convir. E se há arrogância nisso, perdão, não há pretensão.

Aceito a potência do que sinto. A alta voltagem. Vez por outra saio do lugar, mudo de posição, mas não de intenção. Quem deveria ser poupado dos meus excessos, da sordidez dos meus desejos, das personagens anônimas que me habitam?

Egoísmo puro, verdadeiro e doce. Sem lágrimas represadas. Sem espera indolor. Sem calma. Sem máscaras. Sem tentativas de uma realidade forjada, de uma felicidade desenhada com papel carbono, que não é minha. É minha loucura lícita. E eu não conheço nada mais lúcido.
 
Imagem retirada daqui.