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domingo, 8 de fevereiro de 2009

Coisas atuais, de tempos atrás...

Acordou devagar. Ao segundo ou terceiro toque do despertador algoz de todos os dias, que hoje consciente, perdera boa parte do seu poder. Abriu somente os olhos. Não havia movimento em nenhum outro músculo seu. Até o coração parecia meio débil. Podia estar assim. E era vontade sua. Levantara num espreguiçar esplendoroso e até então nenhum pensamento viera à cabeça.

Fez o trajeto de costume, mas hoje sem tanta obrigação, o que permitiu um contemplar diferente das ruas, do vai-vem dos veículos e pôde até perceber a música que tocava ao rádio. Cumpriu suas atividades e retornou à casa, com o pensamento repousando sobre os imensos cúmulos que davam um tom algodoado ao imenso céu azul. Imaginava que precisava dar algumas explicações, metaforizadas, mas explicações. O porquê da ausência, o porquê de uma tristeza aparente...

- É preciso que saibam que estou bem. Que se falo de tristeza, é de uma tristeza ressecada, sem qualquer umidade. Que os olhos que vigiam os escritos não possuem em si qualquer vestígio de lágrima. Que essa tristeza retratada em palavras é emoldurada por uma imensa alegria de ter os pés no chão, de conhecer a si de entender os limites, e de entender também as faltas, mas não há motivo para lamento ou qualquer tipo de punição. Que não há motivo para consolo.

Passou a tarde numa preguiça morna. Havia coisas a serem feitas, mas tudo pode esperar. Fez visitas sem culpa ao espelho e cuidou para que o que visse ficasse ainda mais prazeroso. Seus cabelos estão mais curtos e mais negros que nunca. Conseguia ver, de dentro, o sorriso que reluzia em branco contraste.

Não aguardou por nenhum telefonema e eles todos vieram, aos quais deu as respostas que achou corretas. Não marcou nada. Fez-se de desentendida dos convites feitos nas entrelinhas. Recusou-os nas entrelinhas.

Pôs-se a escrever as tais explicações. É chegado o momento do retorno. Está aberta a temporada festiva. Colocou Chico Buarque para tocar, alimentando-lhe a inspiração. Lembrou-se do vinho. Serviu-se de uma taça, hoje vazia de significados, cheia apenas da cor rubra, do cheiro entorpecente e das vontades que ali nascem.

Com a chegada do céu escuro, decide abandonar os escritos e a taça, agora já vazia. Não tinha a menor certeza se conseguira dar as tais explicações. Mas o que era preciso ser sabido já existia. Ela transpirava significados, estavam todos à flor da pele, sem a menor necessidade dos vidros nos olhos para enxergá-los...
Imagem capturada do blog: blogdapalavra.blogs.sapo.pt

4 comentários:

Bebel disse...

Lindume,
Depois de ler esse texto, relato, conto, crônica, nem sei como classificá-lo, não sou adepta à rótulos, fica aqui um apelo, um pedido, uma súplica, o desejo de que você tire da gaveta o projeto de escrever um livro e o coloque em prática. Não nos prive disso.
Fiquei absorvida pela leitura...
Beijos cheios de admiração e carinho.

Mara faturi disse...

Aff lindinha,
o que é essa explosão doida, mas não doída de palavras, sentimentos e sensações?!!!! me misturei ali, me achei, me afaguei...
Não tem adjetivo que possa descrever a minha emoção , o meu encantamento em te ler;)
* grande aquisição humana e poética desse ano...
bjo grande
grazie Dinda *)*)

Elcio disse...

"O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente."

Já diria Fernando Pessoa.

É isso aí.
Bjs

http://www.instantes.blogger.com.br/

nina rizzi disse...

e esses lençóis amassados, guria...